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Empatia, Reputações e Normas
Sociais: Pilares da Civilização
por Henrique Fonseca
Aluno de Doutoramento no Group for Artificial Intelligence for People and Society, INESC-ID, Instituto Superior Técnico
O Dilema da Cooperação perativo uma “dificuldade insuperável e fatal” da sua teoria,
parafraseando.
N o 125º aniversário da revista Science, em 2005,
foi levantada uma lista de 25 questões com que a Este problema é o centro daquilo que é visto como o
ciência iria lidar nos 25 anos seguintes. Entre elas, Dilema da Cooperação, estudado por áreas como a Ecolo-
encontra-se a pergunta “Como evoluiu a cooperação?”. gia, Biologia, Psicologia, Economia, e recentemente através
A 5 anos do final desta janela temporal, temos algumas de ferramentas matemáticas e computacionais. Se coo-
respostas e teorias, sobre as quais se continua a produzir perar é prestar um benefício a outrem perante um custo
investigação minuciosa, que nos abre a porta para entender pessoal, aqueles que não o praticam nada perdem, sendo
melhor a natureza social do ser humano [1]. capazes de acumular mais recursos que um cooperador.
Por outro lado, se todos os indivíduos numa população coo-
A cooperação, vista como ações que beneficiam outros perarem, maximiza-se o bem público e melhora-se a quali-
perante um custo pessoal, é ubíqua no mundo que conhe- dade de vida do conjunto. Se não cooperar é individual-
cemos, seja no animal, seja no humano – é uma das pró- mente benéfico, e o ser Humano é considerado uma es-
prias fundações da sociedade. Acontece a diferentes es- pécie distintamente racional, porque é que o fazemos?
calas, do nível celular à diplomacia internacional, passando
por todas as dinâmicas de auto-organização do mundo O estudo desta questão e das eventuais respostas tem
animal. Temos exemplos como as abelhas operárias, que vários propósitos, desde o puramente científico, no qual se
deixam de parte a sua capacidade reprodutora para as- procura explicar os porquês da realidade, às aplicações
-sistir a fêmea dominante com a sua descendência para o possíveis na biologia, tecnologia e na sociedade humana. De
bem da colónia; formigas que formam pontes e jangadas; facto, através de ferramentas matemáticas como a Teoria
e chimpanzés que se juntam para afugentar predadores, de Jogos (game theory), dos conceitos de coope-ração ver-
arriscando a sua própria segurança. Os seres humanos, sus competição e de bens públicos, conseguimos modelar
por outro lado, cooperam. Desde em simples gestos como comportamentos como a corrida às armas (arms race),
doar recursos para ajudar a resolver problemas de ou- negociações em relação às alterações climáticas, desvio e
trem – com dinheiro/alimento/sangue/tempo/etc – até poluição de rios partilhados, e muito mais. Tudo isto foi de-
juntar os seus esforços em comportamentos complexos scrito previamente no artigo “A Evolução da Coo-peração”
como criar instituições, estados de direito, sistemas de da alumna de Mestrado Marta Couto na 40ª Edição da
saúde e tribunais, naquilo que é compreendido como rec- Revista Pulsar, e é uma leitura recomendada para aqueles
ompensas não-lineares: quando o total é maior que a soma que pretenderem mergulhar no tema.
das partes.
O referido artigo identifica mecanismos estudados como
Que é ubíqua e constitui uma das fundações da civili- meios de promoção da cooperação. Este artigo dedica-se
zação humana, há poucas dúvidas. Estas prendem-se, no especialmente às dinâmicas da Reciprocidade Indireta,
entanto, à sua origem e a por que razão persiste. Nas ciên- segundo a qual cooperamos porque a vida social do ser
cias económicas, por exemplo, os fundamentos doutriná- humano é um constante balanço entre opiniões de tercei-
rios consideram as decisões individualistas como as mais ros e as nossas próprias reputações, regidas por normas
racionais e que são as que asseguram o ótimo social no sociais – regras não escritas que ditam o que é suposto
processo de afetação de recursos: cada agente económico ser considerado uma ação boa ou má. No capítulo que se
procura maximizar os seus recursos, fazendo sempre as segue, serão brevemente descritos dois estudos do foro
decisões mais alinhadas com os seus próprios interesses. da psicologia que motivam o estudo da Reciprocidade In-
O próprio fenómeno de Seleção Natural, central à Teoria direta.
da Evolução de Charles Darwin, é assente no conceito de
competição, em detrimento da cooperação: implica que as A Reciprocidade Indireta
características que evoluem numa população estão intrin-
secamente ligadas às características que conferem a um Moralidade sob Sinais
indivíduo a capacidade de sobreviver e se reproduzir, em Subtis de Observação
oposição a outros membros desprovidos destas: indivíduos
com maiores capacidades de reunir recursos e os defen- Em 2004, dois investigadores da Universidade da Ca-
der de outros competidores propagarão com maior suces- lifórnia, Los Angeles, fizeram uma experiência curiosa. Con-
-so as mesmas capacidades. Características com sucesso sistia em atribuir a cada um dos 248 participantes uma
evolutivo tendem a ser amplificadas numa população, pelo soma inicial de $10 e uma estação laboratorial que lhe per-
que o próprio Darwin considerou o comportamento coo- mitisse participar sob total anonimato. O que iriam jogar é
apenas uma ronda do Jogo do Ditador (Dictator Game): [2]
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